Atualizado em: agosto 20, 2024 às 9:26 am

Por Guilherme Costa

A multi artista Natasha Durski inicialmente ficou conhecida com o The Shorts, banda na qual ela era a vocalista do grupo que lançou dois discos de estúdio, “Serendipity” (2015) e “Dawn” (2016). Após um grande hiato, que permanece até hoje, Natasha começou a planejar o que seria o seu grande e atual projeto: Feralkat. O primeiro suspiro da nova faceta, foi com o single “Tonight”, lançado em dezembro de 2021.

Já em 2022, com o lançamento do single “Existo”, o projeto e o disco de estreia já eram realidades. A terceira prévia, “Colapso Tropicaos”, saiu em seguida e no dia 3 de novembro saiu o aclamado disco de estreia Corpo no Mundo // Corpo que Habito”, revelando e ampliando as sensações que as prévias do álbum nos causaram. Com camadas densas de sintetizadores, a estreia da Feralkat dialoga com os vários subgêneros da música eletrônica como a Synthwave, Synthpop e Dreampop, além de conter elementos Lo-Fi, Pós Punk e Noise Rock.

Criado numa época de pandemia global e governos negacionistas, Corpo no Mundo // Corpo que Habito” toca na ferida abordando temas como crise climática, social e política. Mas há também homenagens (mesmo que em forma de luto), como na faixa “Lynchiana”, que – como o nome sugere – homenageia o diretor David Lynch – e também o seu pai, que faleceu durante o processo de gravação do álbum.

Durski também trabalha com fotografia e cinematografia. Atividades que desembocam no seu trabalho musical desde a concepção estética, dos shows e dos seus videoclipes. E é com todo esse talento, que a Natasha Durski (Feralkat) é a personagem de agosto do 5 Perguntas.

Foto: divulgação

Passado quase um ano do lançamento de “Corpo no Mundo // Corpo que Habito”, como você olha para a repercussão do seu trabalho, até com base no contato com o público nos seus shows?

Eu vejo uma Feralkat muito mais amadurecida, tanto no quesito shows como também nas possibilidades que encontro pra expressar esse universo múltiplo que é esse projeto. Como eu já participei de outros projetos que tiveram caminhos muito legais dentro da cena brasileira, eu consigo avaliar o momento que estou vivendo com a Feralkat de maneira bastante positiva e numa ascensão bastante interessante. Nesse ano recebi convites pra tocar com artistas incríveis da cena nacional, comecei a tocar nos primeiros festivais (tem mais uma vindo por aí), e isso é reflexo de um trabalho consistente sob o qual me dedico com muito carinho e profissionalismo. A cada show que passa vejo novos rostos surgindo e uma fanbase crescendo, o que é muito legal porque o som da Feralkat também dialoga com o experimental, então acessar as pessoas através da minha música mesmo fazendo um som que até mesmo questiona a indústria (fui atrevida o suficiente pra lançar um single de 6min30 na era da reprodução em 2x e músicas de 1min30) é muito legal. Agora espero conseguir entrar em um selo musical pra expandir ainda mais esse trabalho.

Uma das coisas mais legais da arte é a sua atemporalidade. Como que “Corpo no Mundo // Corpo que Habito”, composto numa época de pandemia global e governos calamitosos como o de Bolsonaro, reflete nos tempos atuais?

Eu acho que Corpo no Mundo // Corpo que Habito fala sobre temas atemporais ao mesmo passo que se conecta com a realidade dos nossos tempos. É um álbum que com certeza traz a aura pandêmica de incertezas e dores, mas ele também reflete sobre questões inerentemente humanas, assim como traz luz a temas que infelizmente vão nos acompanhar cada vez mais nos próximos anos, como o colapso climático. Acho que é um álbum que se debruça justamente em falar sobre a existência em diversos aspectos – fala de amor, fala sobre luta e chama atenção pra problemas sociais, ambientais e políticos, fala sobre dor, e é sobretudo extremamente sincero – o que é bem importante em tempos de superficialidade nas redes. O que eu posso complementar aqui é que a gente precisa estar sempre atenta, porque a história prova que nada é permanente nas conquistas dos nossos direitos, então questionar acaba sendo uma tarefa atemporal.

Foram dois anos entre o lançamento do single “Tonight” e o seu álbum de estreia. Neste meio tempo, quais foram os ajustes e novas ideias para o resultado final do álbum (pensando que “Tonight” é a faixa menos experimental, por assim dizer, do álbum)?

A construção da Feralkat foi um processo que rolou durante todos esses últimos anos. Quando lancei Tonight, eu já estava conceituando minimamente o que era o projeto, sua estética e minhas perspectivas sonoras, mas nesse momento eu não tinha nem a pretensão de ter efetivamente um projeto musical na dimensão que ele alcançou hoje. Acho que quando eu me dei conta do que poderia ser a Feralkat eu me debrucei mais no trabalho com o álbum de maneira mais séria, e isso impactou em ter músicas mais trabalhadas e cheias de elementos e texturas. Tonight foi feita em menos de um mês – e sua criação veio da necessidade de ter uma música autoral pra uma exposição virtual que fiz na pandemia, então ela foi criada, gravada e mixada num contexto bem diferente do restante do trabalho. Eu decidi mantê-la no álbum porque ela trazia algo de solar pra densidade que Corpo no Mundo // Corpo que Habito carrega, e senti que eu conseguia fazer a ponte entre ela e os outros elementos de synthwave que o álbum explora. Então, basicamente, foi um processo de evolução da minha própria percepção do que a Feralkat se tornou pra mim mesma, tanto na questão profissional como na questão afetiva com o projeto e enquanto desdobramento do meu fazer artístico desse momento.

Você também trabalha com fotografia e cinematografia. Como essas duas atividades se fundiram com o trabalho da Feralkat, no que diz respeito à estética dos seus videoclipes e shows?

Quando eu entendi que a Feralkat era o novo projeto que eu iria me debruçar artisticamente, eu resolvi finalmente colocar em prática algo que há muito tempo habitava minhas vontades nos campos das artes, que era fazer um projeto multiartístico. Como eu trabalho com todas essas artes ao mesmo tempo, uma coisa acaba influenciando as outras e minha visão artística se molda nas trocas entre esses diferentes tipos de arte. Vejo música como imagem, vejo imagem como som. A partir dai eu criei um universo para a Feralkat, em que também trabalho a estética e a performance. Os clipes são pensados dentro desse universo, e os shows também são descritos pelo público como cinemáticos e visuais, pois acredito que no trabalho da criação de atmosfera que trabalho para a banda esse aspecto sinestésico também reverbera no público. Acho que é o resultado de conhecer bem todas essas artes a ponto de conseguir explorá-las com uma familiaridade que fica nítida a quem vê o trabalho visual da Feralkat.

Você costuma tocar “Vivid Vision”, do Shorts, nos seus shows da Feralkat. Por que ela foi a escolhida, e como foi pensada a “migração” da música para o lado eletrônico? E há alguma outra música da sua antiga banda que você pretende tocar nos shows?

Vivid Vision sempre foi um ponto alto nos shows da The Shorts, então quis fazer essa homenagem à banda com uma música que sempre foi muito querida pelo público. Acho que a levada instrumental dela sempre colaborou pra transformá-la em uma música eletrônica então a gente basicamente repensou o beat pra ter uma presença maior na música e eu adaptei no bass synth um pouco de como era o baixo e a guitarra da música, que em sua versão original já tinha um synth mais pontual. Sobre colocar outra música da Shorts no nosso set, eu sempre quis trazer Tempestade pro repertório da Feralkat..é uma das minhas preferidas da The Shorts e eu acho que é uma das músicas que mais combinam com o meu som atual.

Em seu Instagram, você comentou que haverá uma nova versão da Feralkat. Você pode adiantar alguma coisa? Tem a ver com um novo lançamento, ou mudança de estética?

Sim, tem a ver com uma nova fase da banda. Embora eu ainda esteja divulgando meu álbum que foi lançado no ano passado, vai vir uma nova fase estética por aí e também a reformulação do show ao vivo. Continuarei a trabalhar o álbum, e tenho alguns planos de remixes e videoclipes, além da turnê nacional que continua e pretende passar pela maior quantidade de lugares que eu conseguir, mas também já estou fazendo uma transição pro que estar por vir na sequência <3