Atualizado em: setembro 1, 2025 às 8:43 am
Por Guilherme Costa
O rock no Brasil é algo que caminha entre o céu e o inferno, uma vez que o estilo — mesmo quando esteve no mainstream — sempre carregou a banda da contracultura. Nesse aspecto, entretanto, alguns estilos conseguiram se adequar a língua portuguesa (algo que o Heavy Metal, mesmo com nomes como o Claustrofobia, encontra certa dificuldade), facilitando a sua exposição ao grande público, como foi o caso do Punk Rock, Rock Psicodélico e do Post-Punk/New Wave. Estes últimos tiveram o apogeu nos anos 80, com grandes nomes: Mercenárias, Muzak — cujo nome vem de uma música do grupo —, Zero, RPM (a que obteve o maior sucesso comercial) e etc.
Assim como o Punk, o Post-Punk cantado na língua-mãe segue firme e forte, encontrando no grupo Jovens Ateus — formado por por Guto Becchi (voz), Fernando Vallim (guitarra), João Manoel Oliveira (guitarra), Bruno Deffune (baixo) e Antônio Bresolin (bateria eletrônica e sintetizadores) — um forte aliado para garantir que o estilo não se perca no tempo.
Formado em 2020, na cidade de Maringá (que já gerou nomes, como o Stolen Byrds, Corona King e Old Skull Guz), Paraná, o grupo lançou o seu disco de estreia, “Vol.1”, no dia 10 de abril, via Balaclava Records. A roupagem densa, melancólica e até mesmo niilista dos trabalhos antecessores ganharam um toque mais polido no recente trabalho; o que não significa que o quinteto perdeu a carga dramática da sua sonoridade.
Se os primeiros singles e o autointitulado EP de 2023 contava a atmosfera densa da Neue Deutsche Welle e da Europa Oriental, como o Nurenberg (Nürnberg) e o Molchat Doma (grupo de Belarus, que tocará em São Paulo em novembro), o disco de estreia há espaços para sintetizadores menos sisudos — embora melancólicos. “Vultos” é a faixa que teve a missão de abrir a (quase) nova roupagem, com o quarteto rítmico disposto a manter o adrenalina no alto, enquanto Guto Becchi oferece um contraponto com a sua voz grave e serena ao cantar “Vultos me fazem perceber/ E o meu corpo não reage bem/ Parece que algo ruim está prestes a acontecer/ E um dia andar pra trás”.
A sequência do álbum tem em “Homem em Ruínas” um Post-Punk mais clássico, com sintetizadores mais comedidos dando espaço para um baixo pulsante e guitarras dissonantes; enquanto “Espelhos” carrega camadas de bandas indies dos anos que tiveram muitas influências do estilo, como o Interpol e o Terno Rei.
O clima é mudado de forma abrupta na metade do álbum, quando Iggor Cavaleira, Max Cavalera, Andreas Kisser e Paulo Xisto marcam presença na faixa “Saboteur Got Me Bloody”. Isso foi uma piada, com traços de verdade, já que a música tem uma introdução à lá “Territory” e depois fica tão pesado quanto tantas coisas que o lendário grupo mineiro fez até o “Arise”. Ela destoa do clima do disco e, por isso, não pode ser o grande destaque do álbum, mas mostra o quão cru e visceral o grupo pode ser.
Após o “acesso de fúria” da sexta faixa, o álbum retoma ao Post-Punk com a faixa “Passos Lentos” — carregada de sintetizadores e bateria eletrônica. Aliás, o “Vol. 1” é muito bem balanceado nas escolhas por linhas mais diretas e outras em que o aspecto eletrônico é mais presente; se eu destaquei os aspectos eletrônicos de “Passos Lentos”, eu destaco a batida e palhetadas secas presente na crua “Instrospecto” — cujo início da letra faz jus ao seu título: “Há mil maneiras de sentir-se só/ Outras maneiras de mentir pra si”.
“Twinturbo Mixtape” encerra o álbum de estreia do Jovens Ateus com um clima mais eletrônico, mais New Order do que Joy Division, e também sintetiza que o grande trunfo do álbum não é apenas emular um Post-Punk clássico, e sim, aproveitar de todos os caminhos que foram criados para o estilo no decorrer dos anos.