Atualizado em: novembro 13, 2024 às 9:58 am
Por Guilherme Costa
A cena underground do Brasil é tão grande quanto o seu território. E é nas diferenças regionais que a cena paranaense tem produzido grandes novas bandas. Já adulto, o meu contato com grupos do “lugar mais frio do país” começou com o Corona Kings, Stolen Byrds e Old Skull Guz (três bandas de Maringá). Cada um em seu estilo, mas todos dentro de uma cena rica. Depois, vieram bandas como o Cyanish, The Shorts (e o projeto da Natasha Durski, Feralkat), In The Rosemary Dreams, Terraplana e o 43duo.
Como eu disse, cada banda tem o seu estilo único. E o 43duo vem mostrando o seu estilo ao longo dos quatro anos de formação. São dois discos (“As Pessoas & As Cidades” e “Se7e Sonhos”) e um EP (“43”), onde Hugo Ubaldo e Luana Santana mostram como as influências – que vão do Pink Floyd ao Tame Impala – foram aderidos ao universo de Paranavaí, Paraná (a cidade natal da dupla).
O álbum mais recente, “Se7e Sonhos”, lançado neste ano, mostrou um rosto mais eletrônico com a dupla experimentando diversas camadas etéreas de sintetizadores. Mas o que não mudou foi a ligação da dupla com a natureza, sempre ressaltada nos seus três registros de estúdio, rendendo grandes músicas como “Entrega” e “Rememorar” (citando as minhas favoritas) e videoclipes, como o da faixa “Me7ade”.
Hugo Ubaldo e Luana Santana responderam às minhas perguntas no novo episódio do Um Outro Lado Entrevista!
Conte como aconteceu a criação da banda, e quais foram as influências em comum que motivaram a formação do 43duo?
Primeiramente, gratidão pelo espaço aqui na Um Outro Lado da Música, abraço Gui.
A banda nasceu em 2020 durante a pandemia. Nós já éramos casados fazia 4 anos, e sempre gostamos muito de pegar o carro e sair de viagem por aí, vários destinos, dormíamos no carro… curtimos muito. Quando essas viagens terminavam, sempre pensávamos: “Nossa, seria muito massa fazer esse rolê tocando! Poderíamos montar uma banda!”. Porém, cada um tinha outros projetos musicais, e os dois são bateristas de “nascença” (risos). Uma banda de dois bateristas seria muito outside, conceitual demais. Enfim, a Covid-19 bateu forte, todos e todas em casa, foi o momento! Não teve para onde correr, fizemos a banda. Na escolha de funções, eu (Hugo) passei para a guitarra, comecei a estudar (tinha muito tempo livre), fizemos as primeiras composições, ensaios e nosso sonho antigo se tornou realidade. A “coisa” foi meio inesperada, porém, muito sonhada.
As letras do 43duo tem uma grande ligação com a natureza e a relação do ser humano com ela. Para vocês, qual faixa consegue sintetizar a mensagem da banda?
Essa ligação com a natureza vem muito de onde nós somos. Paranavaí é no interior do Paraná. Nesse “mundo” interiorano, as coisas naturais respiram “melhor”, de alguma forma ainda. Nós vivemos em contato de uma quantidade de natureza (deveria ser muito mais), e nossa infância foi muito vivida nesse universo. Dentro de um local de fala e luta, a defesa do meio ambiente, e a nossa relação humana com ele, é o nosso lugar. Um lugar justo, e necessário que nos cabe, e é de obrigação humana defender. Se fosse para escolher uma faixa para sintetizar a mensagem seria “Natureza”, ela está em nosso primeiro álbum “As Pessoas & As Cidades”, de 2021.
No início do ano vocês fizeram uma turnê pelo centro oeste e norte do país, e após o lançamento do disco “Se7e Sonhos” foi realizada uma turnê que passou por São Paulo, Presidente Prudente e cidades do sul do país. Qual foi o saldo dessas turnês? Houve cidades que vocês tocaram pela primeira vez? Público conquistado após o novo disco?
As turnês deste ano de uma modo geral foram sensacionais. Nossa intenção era fazer todas elas com o “Se7e Sonhos” lançado, porém, as oportunidades vão surgindo, e nós preferimos ir abraçando sem postergar. Mas de uma forma geral, todas as turnês foram muito boas. Tocamos pela primeira vez em Goiânia, Brasília, Palmas, Presidente Prudente e Blumenau. Essas foram as principais cidades novas. Mas é sempre uma alegria voltar a São Paulo, Florianópolis, Curitiba e Porto Alegre; são cidades que com o novo álbum, fizemos novas parcerias de bandas/produção, e um novo público. Existem encontros que são memoráveis, fizemos parcerias lindas esse ano com artistas sensacionais como: A Virgo (Novo Hamburgo – RS), Feralkat (Curitiba – PR), Kanichi (Palmas – TO), Ultimato (Porto Velho – RO), Retrato (São Paulo – SP) e Antiprisma (São Paulo – SP). E como notícia de primeira mão, em Dezembro vamos fazer uma tour que passará pelo Rio Grande do Sul, Uruguai e Argentina. Será nossa primeira vez na Argentina, estamos muito empolgados.
No show aqui em São Paulo, eu conversei com o Hugo a respeito das mudanças do “Se7e Sonhos” em relação ao álbum de estreia. Então eu repito a pergunta aqui: como surgiu a ideia de adicionar elementos eletrônicos e como foi para balancear com a estética que vocês fizeram na estreia?
Esses movimentos de mudança ocorrem de uma forma natural. As canções demo foram surgindo, e nós gostamos de experimentar elas ao vivo, na maioria das vezes nós já sentimos como elas podem ficar. No “Se7e Sonhos” nós resolvemos contratar um produtor, nós julgamos que era o momento de experimentar algo novo. A produção do álbum ficou a cargo do Felipe De Mari Scalone (Cyanish), de Londrina. A produção durou uns 6 meses, entre escolha de demos (eram umas 32), ensaios e a gravação/produção final. Foi uma experiência muito enriquecedora adicionar o Felipe nesse movimento de construção e modulação das canções. Algumas ideias eletrônicas nós tivemos ali, na hora dos ensaios de experimentação. Foi muito bacana. Em relação às partes eletrônicas, nós somos desprendidos com a questão das músicas serem executadas totalmente iguais ao álbum no ao vivo. Sem contar que no palco somos em dois, e não tem jeito (risos); por mais que o duo soe como um power trio, pelo fato da Lu fazer bateria e baixo ao mesmo tempo, temos uma “limitação”. O que na nossa opinião, faz a coisa ser única e toda vez mudar um pouco.
E quais são os desafios para reproduzir as faixas do novo álbum ao vivo?
Nosso terceiro álbum está em processo de produção. Já escolhemos as canções e estamos lapidando algumas coisas. Contratamos o Felipe Scalone para assinar a produção novamente. Após o lançamento do “Se7e Sonhos”, que é um trabalho que adoramos, sentimos a necessidade de deixar as coisas o mais orgânicas possíveis. Nas primeiras reuniões de produção já comentamos isso para o Felipe. Algumas dessas músicas novas já estão no setlist dos shows que estamos fazendo, ou seja, o caminho será: do ao vivo para o álbum. De um certo modo, o trabalho será mais “fácil” (risos). Gravar ao vivo é um desafio e tanto, mas não excluímos fazer alguns overdubs, o que é natural. Mas adiantando, esse álbum vem com o intuito de ser um retrato orgânico e com a cara do que as pessoas ouvem ao vivo.
Uma pergunta para a Luana. Como foi a adaptação quando você passou a tocar bateria e sintetizador ao mesmo tempo? Houve alguma música que teve de ter alguma “readaptação”?
Foi bem desafiador, mas, um desafio divertido. O teclado já é um instrumento bem percussivo, então foi um trabalho principalmente de coordenação motora, que já é um estudo bem presente, quando se estuda a bateria. Mas, também foi interessante, começar a pensar nas músicas com uma bateria sendo tocada com uma mão só. É uma característica que colabora pro som do 43duo ser bem “único” hehe
E, sim, teve algumas músicas, mais do início da carreira, que adaptei para tocar ao vivo com o synth bass, como a “Same Road”, que já possui um baixo na sua gravação. Mas, foi bem de início mesmo, porque logo já engatamos firme nesse novo formato para novas composições!
Você também participa do projeto Rolê das Manas e da banda Vênus Disorder. Conte um pouco sobre como surgiu o projeto e a importância deles (sobretudo o Rolê das Manas).
A Venus Disorder é uma banda formada somente por mulheres, e nasceu de uma amizade e parceria de trabalho antiga que temos eu, a Natália Gimenes (baixista) e Débora Louize (vocalista), vinda de outras bandas, também só de mulheres. Na sua formação também contamos com duas guitarristas sensacionais, Juliana Lopes e Gabriela Vivan. A motivação sempre é a mesma: união de musicistas, empoderamento feminino, ocupação de palcos e rolês com a força feminina. O Rolê das Manas nasceu nesse mesmo cenário, criado pela Natália Gimenes, veio com propósito de enaltecer a força feminina na arte, seja na música, artes visuais, artesanato, literatura, etc. Começou em 2017, e desde então já fizemos mais de 10 edições. Tanto o Rolê, quanto a Venus Disorder, são movimentos muito importantes, não só pelo empoderamento feminino no geral, mas, principalmente, porque inspiram e trazem referências para moças mais jovens ingressarem e se expressarem na arte, seja na música ou em qualquer outra área. Falo isso como uma mulher, baterista que toca rock, que é um “ambiente” totalmente dominado por homens. Às vezes, só precisamos ter mais referências femininas, seja organizando eventos, tocando uma guitarra, um contrabaixo, uma bateria.. pra gente se dar conta que podemos fazer o que quisermos. Pra mim, esse é o ponto principal desses dois projetos.
Agora uma para o Hugo. Neste ano você lançou o seu EP solo “Canções do Amanhã” e soa um pouco diferente de “Se7e Sonhos”. Qual foi a motivação para a gravação dele e se você pensou em fazer diferente do 43?
O EP “Canções do Amanhã” foi um projeto aprovado na Lei de Incentivo Paulo Gustavo, e foi uma honra poder executá-lo. As canções formam um compilado de músicas que compus, mas que na minha opinião, não caberiam para o 43. Soar diferente do 43 era a minha ideia, e fico feliz que você tenha achado isso (risos). Fazendo uma meia culpa, o que me motiva é estar fazendo algo diferente sempre, acho que peco às vezes por não repetir, ou dar tempo ao tempo. Uma ansiedade artística me pega às vezes. Mas enfim, faz parte. Esse EP tem a ideia de retratar em algumas canções, o meu amor pelos rios. Nós vivemos em um lugar onde o rio, a pesca e a vida que cerca isso, é muito importante. Tentei de alguma forma caminhar por esse lugar.
Vocês têm compartilhado posts a respeito de um novo álbum de estúdio, que terá o Felipe Scalone na produção. Há alguma previa que vocês possam comentar de como será o próximo álbum?
Como citamos anteriormente, trabalhar com o Felipe Scalone nos agrada muito. Além de todo profissionalismo e trabalho árduo (que nos agrada), criamos uma amizade sincera, muitas risadas, almoços e algumas cervejas. Esse álbum vai vir para materializar uma maturidade do nosso formato. As coisas estão sendo feitas para transportar a sensação do ao vivo para o álbum. Algo que se conecte, o máximo possível, no que é visto ao vivo. Quem quiser ouvir algo do novo trabalho, é só comparecer aos shows que estão rolando, algumas das canções estão no set. Forte abraço e gratidão pelo espaço. Vida longa e próspera ao Um Outro Lado da Música.