Atualizado em: agosto 6, 2025 às 7:44 am

Por Arthur Coelho

É difícil achar outro estilo musical que tenha tantas ramificações e subgêneros quanto o metal. Seja numa mistura de elementos do hardcore, punk, pop ou com instrumentos nunca antes utilizados, basta procurar que você vai achar todo o tipo de banda fazendo o som mais diferente possível.

Um dos gêneros mais ousados e criativos é o Post-Metal, que se popularizou nos primeiros anos da década de 2000 com bandas advindas do Sludge e do Doom e que praticamente desconstruíram o Metal de forma experimental.

Seu som é uma mistura de elementos progressivos que visam uma pegada ambiental e atmosférica com o uso de teclados e sintetizadores, guitarras de baixa afinação que andam sobre a alternância do minimalismo/crescente e que fazem parte de um todo instrumental que é construído pensando em um clímax potente.

É muito mais fácil identificar tudo isso ouvindo do que lendo. E é por isso que a recomendação da semana é o disco “Panopticon”, da banda estadunidense ISIS, uma das pioneiras no estilo ao lado de Pelican e Neurosis.

Capa oficial do disco

O álbum saiu no dia 1 de janeiro de 2004 e deu sequência aos trabalhos deles no que vinha a se concretizar como um clássico essencial do Post-Metal. Seu nome entrega um conceito presente nas complicadas letras de um total de sete faixas com quase 1 hora de duração total.

A palavra “Panopticon” vem do modelo teorizado por Jeremy Bentham no século XVIII como uma prisão onde, de um ponto de vista privilegiado, um guarda poderia ver todos os prisioneiros ao redor. Isso, sem que saibam se estão realmente sendo vigiados ou não naquele determinado instante.

Em entrevista para a Southern Records, o vocalista e guitarrista Aaron Turner chegou a comparar essa ideia com políticas do governo dos Estados Unidos (Governo George W. Bush), apesar de deixar claro que o terceiro disco de estúdio da banda é muito mais pessoal que político:

“Mesmo se você for um falante nativo, às vezes é impossível descobrir as letras corretamente. Estou em conflito com isso de vez em quando. Mas então eu sempre acho que estou dando o suficiente com o texto que está incluído, a arte e as imagens que dão às pessoas alguma pista para entrar nisso. Mas deixa em aberto até certo ponto sobre a intenção por trás disso. […] Ao fazer um álbum, também é música em primeiro lugar para nós e letras em segundo”.

Fato é que, independentemente das letras, o principal ponto de destaque aqui está na criação instrumental, que dá ênfase ao espaço de crescimento para cada um dos instrumentos: do baixo à bateria.

As músicas do ISIS pouco apresentam versos vocais e sabem bem como trabalhar o silêncio; “In Fiction”, um dos principais nomes da discografia, mostra isso muito bem. Beirando os dez minutos de acordes progressivos, ela apenas apresenta seus gritos na metade final de sua canção, quando caminha para um clímax de riffs fortes e explosivos através de letras existenciais:

Through fiction we saw the birth/Of futures yet to come/Yet in fiction lay the bones/ Ugly in their nakedness/Yet under this mortal Sun/We cannot hide ourselves (Através da ficção, nós vimos o nascimento/De futuros ainda por vir/Ainda na ficção, lançar os ossos/Feio na sua nudez/Ainda no âmbito deste sol mortal/Não podemos nos esconder)

Ela é a única a contar com um videoclipe; confira em:

Inícios de músicas tomados por ruídos e sons estranhos também não são novidades para o grupo formado em Boston, Massachusetts. Esse elemento forma parte da identidade visual deles e está presente tanto em “Will Dissolve”, a menor do compilado com seis minutos, quanto nos nove minutos e meio da revoltada e pesada “Syndic Calls”.

Um ponto de variância para o Post-Metal são os vocais e o Isis sabe bem como variá-los de acordo com o que a música está pedindo. “Blacklit”, que tem momentos que aproximam a música de uma balada instrumental, é um dos nomes que varia pela sensibilidade tanto nas vozes quanto no instrumento.

Ela coloca Aaron Turner para cantar de forma limpa e soa de forma mais polida, algo que dura por poucos versos. Quando o caminho progressivo de seu som pede por novas vozes, ela já aparece de forma completamente distinta, com gritos rasgados e quase guturais.

O mesmo ocorre com a abertura “So Did We”, uma das melhores produções da carreira do Isis, que é tomada por um início arrebatador que passa por minutos de transições e viradas até se embalar novamente em um clímax potente.

Seu momento mais explosivo não surge com o retorno dos vocais, pois aqui eles apenas marcam uma passagem para o verdadeiro elemento que é capaz de levar o som ao máximo: o ressoar conjunto de todo o instrumental que passou por diversos compassos construindo minuciosamente o momento de ápice.

A faixa conta com quebra de tempos e é tocada em 6/4 no lugar do tradicional 4/4. Da mesma forma, também é marcada por um existencialismo reflexivo em seus curtos versos.

“Our skin worn thin/Our bones exposed Life reduced to ticks/From forest caves and azure skies /We crashed upon this earth The years they passed and so did we/But, resistance would be brought (Nossa pele fina desgastado/Nossos ossos expostos/De vida reduzida a carrapatos/Das cavernas da floresta e céu azul/Nós caímos sobre esta terra/Os anos passaram e nós também/Mas, a resistência seria levada)”

Nesse atual momento, já deu para perceber que as músicas do Panopticon não são destaque por priorizarem um elemento em específico, e sim pelo conjunto da obra. Suas músicas são resultado de um processo criativo e mútuo de Aaron Turner (guitarra, vocal), Mike Gallagher (guitarra), Bryant Clief Meyer (teclado e guitarra), Aaron Harris (bateria) e Jeff Caxide (baixo).

E podemos dizer que o processo de composição do grupo talvez tenha seu auge na acústica “Altered Course”, que atravessa o ouvinte por inúmeras camadas de sons espaciais e que conta com a participação de Justin Chancellor, baixista do Tool.

O quinteto fecha o compilado com “Grinning Mouths” em uma construção sombria, misteriosa e que envolve o ouvinte em um estado constante de tensão com potencial épico.