Atualizado em: abril 1, 2025 às 7:45 pm
Por Arthur Coelho
O Joyce Manor é um daqueles grupos que provam que a espontaneidade é o melhor elemento que uma banda pode ter. Com letras cotidianas, sentimentos universais e certa trivialidade, a banda de punk rock californiana mostra que não é preciso ser nenhum tipo guitar hero para fazer música de qualidade.
Formado em 2008 na cidade de Torrance, o grupo atualmente conta com a participação de Barry Johnson (vocal e guitarra), Chase Knobbe (guitarra) e Matt Ebert (baixo e vocal), precisando do suporte de músicos de apoio em outras funções quando participam de shows, assim como aconteceu em suas participações em São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba em novembro do ano passado.
Uma formação fixa pode não ser o forte deles, mas a criação de músicas divertidas com certeza é. Se apegando ao ideal de faça você mesmo (o famoso DIY), o Joyce Manor combina influências do punk dos anos 80 com uma pegada mais atual e melódica, sobretudo em seu disco “Never Hungover Again“, de 2014, época em que a banda contava com Kurt Walcher na liderança da bateria.
Assim, eles são responsáveis pela participação de uma cena alternativa completamente nova e que também se insere em novos valores, trazendo histórias estranhas e inusitadas para o lado da música curta e intensa. A faixa de abertura, “Christmas Card”, por exemplo, narra uma briga que resultou em um termino de relação, conforme confirmado pela própria banda nas redes sociais.
“Looking at your face in the dark/ You don’t even look that smart/ Could never make it past that part/ And now I guess we never Will (Olhando o seu rosto no escuro/ Você nem parece tão inteligente / Eu nunca consegui passar dessa parte anteriormente / E agora eu acho que nunca irei)”.
Toda a ironia da discussão de casal também esconde um lado afetuoso que tentamos ignorar no momento “(I’m gonna stay with you until You disappear into the crowd/ Eu vou ficar com você até que você desapareça na multidão)”, porque no momento específico ninguém mais se entende: “I don’t know what you tried to tell me/ You know I think about it still (Eu não sei o que você tentou me dizer/ Você sabe que eu ainda penso nisso)”.
E talvez os sentimentos não sejam um objeto de interpretação, porque o amor é algo muito mais surpreendente e inesperado do que uma métrica planejada.
“Your body’s saying: Isn’t that enough? /Your brain is going: I don’t give a fuck/ You treat it like a game of skill, But it’s more like a work of art Or money in a Christmas card (Seu corpo está dizendo: isso não é o suficiente? / Seu cérebro falando: eu não me importo/ Você trata como se isso fosse um jogo de habilidades, mas isso é mais como uma obra de arte ou dinheiro em um cartão de natal)”.
A sequência “Falling In Love Again”, um dos grandes sucessos do álbum, é como um recomeço para o personagem da faixa de abertura, se apaixonando novamente – ainda que ainda tenha receios por conta de sua última relação:
“Hope you don’t think I don’t care/ Because I do/ I just don’t know if I/ Should feel this bad about you (Eu espero que você não pense que eu não me importo/ Porque eu me importe/ Eu apenas não sei se eu deveria gostar tanto assim de você)”.
A faixa começa com uma levada de bateria no surdo e riffs tranquilos, passando por uma parte mais instrumental em que os pratos aparecem e todo um clima romântico é criado pela banda punk.
O melodrama continua forte em “End of the Summer” e sua marcante linha de baixo que narra o caso de um romance de verão (ou de férias) a partir do refrão em coro dos vocalistas da banda.
“I start to feel it fade away/There’s nothing I can do/ At the end of the Summer/ Try to imagine there’s a way/ For me and you/ At the end of the Summer (Eu comecei a sentir que isso fosse desaparecer/ Não há nada que eu possa fazer/ No fim do verão/ Tente imaginar que há um jeito para eu e você/ No fim do verão)”.
Já o exato oposto acontece num passeio em que tudo deu errado “(Had such a bad time hanging out/ Tive uma péssima experiência saindo)” no encontro da garota que dá nome à faixa. Pelo lado bom, o seu desastre rendeu um belo refrão carismático: “Victoria – You’ve got me hanging on again (Victoria, você me deixou pendurado novamente)”.
Se o Joyce Manor tivesse um superpoder, ele seria obviamente o de transformar qualquer acontecimento em música, porque “Schley” é sobre uma brisa paranoica após ficar chapado, segundo o vocalista e guitarrista Barry Johnson.
“So watch out, you’re in danger/ Like your name, the way it looks carved into the cover of a telephone book/ I don’t care, I’m never gonna/ It sounds better when you’re high on marijuana (Então tome cuidado, você está em perigo, assim como seu nome, a maneira como ele parece esculpido na capa de uma lista telefônica/ eu não ligo, eu nunca vou/ isso soa melhor quando você está chapado de marijuana)”.
O título é o nome real de área industrial em Wilmington, na Califórnia, onde tudo isso realmente aconteceu. O curioso é que a música soa muito mais como psicodélica do que aterrorizante ou coisa do tipo.
A faixa seguinte é “Heart Tattoo”, uma canção sobre o desejo compulsivo de se fazer uma tatuagem de coração (e também pode ter sido escrita durante algum tipo brisa). Sua letra pode não ser das melhores, mas sua melodia é bastante divertida e um tanto quanto intensa. E o mesmo pode ser tido sobre “The Jerk”, que tem um forte refrão melódico em uma pegada super-rápida: “Don’t say goodbye say you’re not sure/Anything could ever come between the two of us/I would say the same thing (Não diga adeus, diga que você não tem certeza/Qualquer coisa pode vir entre nós/Eu diria a mesma coisa)”.
Uma das melhores letras aparece na canção de número oito: “In the Army Now”, que homenageia o filme de mesmo nome lançado em 1994 (No Brasil, seu nome é “Um Maluco no Exército”). A lírica se inspira no enredo de dois homens que tentam sair do exército fingindo serem homossexuais “(I wanna kiss you through your hockey mask/ Eu quero te beijar através da sua máscara de hóquei)” e conta com um impecável vocal dramático que parece ter uma grande influência das músicas do The Smiths. Sua linha de baixo também é outro absurdo.
“Look good in the photograph/Cause we’re in the army now/Where were you when you felt left out? /It’s all shit for families anyway (Olhe bem para a fotografia/Porque nós estamos no exército agora/ Onde você estava quando se sentiu excluído? /É tudo uma merda para as famílias de qualquer maneira)”.
“Catalina Fight Song” é a penúltima música e a segunda mais famosa de toda a discografia do Joyce Manor, mesmo contando com a curta duração de um minuto e cinco segundos.
“There’s no way to keep in touch with certain people/You wonder how long something can last/Pretty sure most people don’t think about that (Não há forma de manter contato com certos tipos de pessoas/Você imagina quanto tempo algo pode durar/ Com certeza muitas pessoas não pensam sobre isso)”.
Sua letra combina temas variados sobre despedidas e desconexões entre pessoas que um dia já foram muito amigas, soando de forma raivosa nos vocais e com guitarras que se destacam numa atmosfera nostálgica.
Por fim, “Heated Swimming Pool” fecha o álbum “Never Hungover Again” com a canção mais tranquila e pop rock da compilação, mais uma vez dando destaque ao ritmo do baixo e a trechos instrumentais sem vocais. Sua curta composição fala sobre uma amizade decadente e se utiliza de frases icônicas para enfatizar essa relação, como o trecho: “I wish you would have died in high school/ So you could be somebody’s idol (Eu queria que você tivesse morrido no ensino médio/ Para que você pudesse se tornar o ídolo de alguém)”.
Dessa forma, o Joyce Manor fechou o seu terceiro disco de estúdio com uma atitude agitada, letras confusas e uma melodia inacabável. Uma verdadeira obra prima pós ressaca (apesar do que o título diz) que você não vai querer pular nenhuma faixa.