Atualizado em: abril 9, 2025 às 7:19 am

Por Arthur Coelho

O Mastodon se consolidou como uma das melhores e mais criativas bandas de metal do século XXI. O quarteto de Atlanta (que agora é um trio, após a recém-saída de Brent Hinds) revolucionou sua cena musical com discos que iam do death metal até o sludge e o progressivo, mostrando que um grupo musical não precisa se prender numa mesma fórmula para soar bem.

Por esses e outros motivos, é muito difícil escolher qualquer trabalho deles para recomendar a alguém, até porque todos eles são muito bons em diversos sentidos. Do álbum de debute (“Remission”) até o mais recente (“Hushed and Grim”), qualquer compilação pode ser escolhida sem qualquer medo pela parte do ouvinte.

E para a surpresa de alguns, o trabalho deles que falaremos hoje não é um disco, e sim um EP lançado pela banda em 2017 e que não deixa de estar fora das obras primas mastodônticas!

Oficialmente lançado no dia 22 de setembro pela Reprise Records, “Cold Dark Places” reuniu músicas gravadas pela banda durante os trabalhos de “Once More ‘Round The Sun” (2014) e “Emperor of Sand” (2017). Ele conta com apenas quatro músicas e uma duração de 21 minutos e mostra um lado da banda que se distancia um pouco de seu som mais ligado ao gênero do metal, também servindo uma mescla de vocais totalmente limpos com momentos progressivos.

Suas músicas também conseguem trazer uma atmosfera quase conceitual que confirma o título da compilação. Ouvir “Cold Dark Places” é como entrar numa viagem à noite para uma terra tomada por altos picos cobertos de neve.

“North Side Sta”r abre o EP com muitas camadas de vocais juntos (que quase não dá pra entender o que estão falando) e um instrumental que parece ter sido tirado diretamente de “Crack the Skye” (2009).

“The countdown’s begun/ The world is ending/ Where are we now/ And what have we done? (A contagem regressiva começou/O mundo está acabando/Onde estamos agora? /E o que fizemos?)”

Sua letra trabalha em toda uma atmosfera apocalíptica que não é tratada de forma desesperadora, mas com uma aceitação do fim dos universos. O baterista Brann (Dailor) entra com seus belos vocais em determinado momento e Brent (Hinds) mostra toda sua genialidade com dois solos que constroem a música.

“You and I/ We could expire/ Right here and now/ Wouldn’t matter at all (Você e eu/ Podemos falecer/ Aqui e agora/ Nada importaria)”

Blue Walsh mostra um Mastodon nunca antes visto, soando como uma banda de rock alternativo e mais melódico do que nunca. Seus poderosos riffs são tomados por um instrumental inspirado pelo blues.

“As we hang from the vine /We swam on the thin red line/I’m asleep in the deep/Asleep in the dark black sea (Enquanto estamos a um passo da morte/ Nós mergulhamos na tênue linha vermelha/ Estou adormecido em meu interior/ Adormecido no mar da escuridão)”

Brann toma conta da música com seus vocais e uma letra melancólica que já dava spoilers para temas que viriam a seguir no conceitual disco “Emperor of Sand”. O baterista/vocalista foi citado, mas a banda toda se destaca em seus respectivos papéis. Os riffs de Bill (Kelliher) trazem uma sensibilidade inacreditável para a canção e Troy (Sanders) também brilha em seus momentos vocais profundos.

“I call out your name/All I hear is the pouring rain/When you came into view/I realise it’s not you (Eu chamo o seu nome/ E tudo o que ouço é o cair da chuva/ Quando te avistei/ Eu percebi que não era você)”

A canção que mais fez sucesso em todo EP é “Toes to Toes”, com mais de oito milhões de reproduções apenas no Spotify. A faixa inicia com um instrumental de banjo e palmas que apoiam o som da caixa até Brent entrar com um dos melhores vocais que ele já criou em sua trajetória com o Mastodon.

“I walk alone into the darkness/ I came toe to toe and face to face with the beast/ He knew me by my name, it was surprising/ He knew everything about me that I despised (Eu andei sozinho na escuridão/ Eu estive de igual para igual e encarei o diabo/ Ele me conheceu pelo meu nome, foi surpreendente/ Ele sabia tudo sobre mim que eu desprezava)”

Aqui, mais uma vez, a banda de Atlanta mostra seu caprichoso rock alternativo com elementos progressivos e que não deixam carregar os solos distintos e sua frenética bateria.

Mordido pelas presas das circunstâncias

“Outward light a reflection/ We are all equal /Mutable ways of my fortune/ Bitten by my fangs (Uma reflexão exterior iluminada/Somos todos iguais/Debaixo da laje do materialismo/Formas mutáveis da minha fortuna/Mordido por minhas presas)”

Em todos os sentidos dá para entender o motivo de “Toe to Toes” ser considerada a melhor faixa do EP entre outras tão boas. Ela é sincera, tem uma letra tocante e mais uma vez mostra a banda flertando com a redenção espiritual do modo ‘badass’ e sentimental que apenas o Mastodon consegue fazer.

Por fim, a faixa que dá nome ao registro encerra a compilação de forma filosófica, novamente colocando Brent na liderança dos vocais e em posição de transformar a música em uma triste canção do sul dos Estados Unidos com um violão entrando em cena.

“I love your face and the things that you do/Make me warm sometimes when I’m away/I guess you’d say that at the end of the day/You’ll be the only person here that exists/You left my heart in some cold dark place/Where your love grows on a vine and I see it all the time/I didn’t mean a word that I said/When I was lying to your face about being alone (Eu adoro seu rosto e as coisas que você faz/ Me faz aquecer quando estou longe/ Eu acho que você diria isso no final do dia/ Você será a única pessoa existente aqui/ Você deixou meu coração em algum lugar frio e escuro/ Onde seu amor cresce em uma videira e vejo isso o tempo todo / Eu não quis dizer uma palavra que eu disse/ Quando estava mentindo na sua face por estar sozinho)

Definitivamente, “Cold Dark Place” não apenas se despede do ouvinte da compilação, como também narra uma triste história de separação entre dois personagens.

E gostaria que eu soubesse como respirar novamente

“And I wish I knew how to breathe again/ I fear I’m gonna die inside my skin/ This has gotta be the last time that we fight/ Or go at each other’s throats/Will you go, as I want to mend? (E gostaria que eu soubesse como respirar novamente/Temo que eu vá morrer dentro da minha pele/Esta deve ser a última vez que lutamos/Ou iremos às gargantas um do outro/Você irá, enquanto eu quero consertar?)”

De forma teatral, sua história é encerrada com uma mudança de atmosfera por parte do Mastodon, que transforma sua canção triste e melancólica tocada no violão em uma ida a mais escura das cavernas através de um obscuro riff que deixa tudo mais escuro nesse lugar frio.