Atualizado em: setembro 2, 2025 às 8:52 pm

Por Arthur Coelho

Há diversas formas de se descobrir uma nova banda, mas a tradicional sempre foi participar do famoso boca a boca, que agora divide atenções com os algoritmos das plataformas de streaming de música configurados para indicar artistas similares.

Apesar de muito útil, essa opção, porém, dificilmente encontra determinados artistas menores, ainda mais quando falamos de gêneros pouco conhecidos. E foi por isso que o MotimMotim não apareceu pra mim em um streaming de música ou matéria na internet, e sim através de um livro.

“Mil olhos, mil braços: relatos de um punk antropofágico na China vermelha”, lançado pela Autonomia Literária, é um misto de devaneios culturais com uma autobiografia de Ale Amazonas, que você provavelmente ainda não sabe quem é.

Suas páginas falam sobre a história do jovem curitibano no mundo da música e principalmente sobre sua aventura como baterista do Oh! Dirty Fingers, grupo de punk chinês, que poderia muito bem ser a recomendação da vez.

Antes de fazer parte da histórica banda, Ale Amazonas tocou em outras bandas no Brasil e uma delas foi justamente o MotimMotim, grupo que durou pouco tempo e chegou a lançar um EP caótico cheio de influências da cena screamo.

Além dele, os compositores Mauricio Marques e Felipe Augusto Soares também faziam parte do grupo que foi responsável por lançar “Sobrevivendo a uma Rotina de Incertezas” de forma independente no primeiro dia do ano de 2010.

O EP de seis músicas da banda curitibana está disponível no Spotify desde 2021, mesmo ano em que o livro foi lançado.

Com tambores secos e um riff sinistro, os trabalhos abrem com a faixa “Saudade”, tomada por uma atmosfera que lembra muito o disco “Chaos Is Me”, da banda Orchid.

A partir daí, o vocal entra em cena com uma mistura de gritos típicos do gênero screamo com o coro que repete “um amigo em mim”. Além de um riff agudo que entra em destaque.

O som do MotimMotim une elementos do chamado ‘emoviolence’, com um som barulhento que se arrisca na mistura de vocais e riffs caóticos como plano para letras sentimentais e dramáticas escritas em poucos versos.

Além do já citado Orchid, outras bandas como o Saetia e os brasileiros do Saddest Day possuem alguns elementos em comum com o som dos curitibanos, que conseguem soar de forma mais encorpada ao flertar com outros estilos.

“Vir-A-Ser”, a segunda faixa, é um exemplo disso, pois chega a ter momentos de grindcore com direito à utilização de pedal duplo na bateria e tudo mais.

Já “Enchente” dá continuidade com outra pancada, alternando entre momentos de Orchid com batidas de blast beats e a alternância de vocais limpos com algo próximo de um gutural.

Enquanto “Três Guarda-Chuvas” mistura os screamo com riffs que poderiam ser tirados do post-hardcore ou do metalcore. A letra da faixa é uma das melhores da compilação e arrasta a atmosfera hidrofóbica anterior a um clima épico.

Em 2023, ela chegou a ganhar uma versão estendida em forma de poesia no canal do Youtube antigo baterista.

A rápida “Ponteiro” é uma espécie de discurso hardcore que não deixa o nível cair com um momento de breakdown e, para variar, muitos gritos.

O ótimo ep fecha com “Viver Fim”, som que canaliza bem todo o caos do MotimMotim e se despede com os assombrosos e dramáticos gritos “É o fim….é o fim…é o fim de mim”, que literalmente decreta a compilação de uma banda que não existe mais, mas mesmo assim pode ser considerada uma raridade perdida.