Atualizado em: setembro 2, 2025 às 8:49 pm
Por Arthur Coelho
É difícil falar de heavy metal sem citar a importância do Black Sabbath, mas é ainda pior tentar citar o quarteto de Birmingham, Inglaterra, sem abordar o carisma marcante de seu frontman Ozzy Osbourne, que deixou o mundo na última terça-feira (22).
Poucas semanas antes de falecer, ele ainda conseguiu se despedir dos fãs e companheiros precursores de banda com o festival beneficente “Back to the Beginning” que reuniu o vocalista com a clássica formação ao lado de Tony Iommi (guitarra), Geezer Butler (baixo) e Bill Ward (bateria).
E já que estamos falando da união do icônico quarteto, vamos aproveitar para literalmente voltar ao início e relembrar sobre o álbum que colocou os ingleses para revolucionar o mundo da música.
O disco homônimo do Black Sabbath foi lançado numa sexta-feira 13 de fevereiro de 1970 e é considerado um marco precursor da criação do heavy metal. Além de responsável por uma influência que foi além de números comerciais e inspirou outros grupos a experimentarem um som totalmente diferente com afinações graves e uma atmosfera sombria que é tema do álbum.
Desde o primeiro contato com a obra dá para sentir certo ar mórbido e sobrenatural, como se retirado de algum filme de terror de bruxaria. A misteriosa capa planejada por Marcus Keef – também responsável pela arte de “Paranoid” – e protagonizada por Louise Livingston num cenário abandonado, cinza e sem vida é prova disso.
Essa conjuntura prepara a pessoa ouvinte para o início denso, pesado e assustador da famigerada música que abre os trabalhos do álbum com o também nome da banda, mas não sem antes adicionar sinos, sinais de chuva e tempestade na introdução.
Ela pode não ser a favorita de quem ouve a banda, mas certamente é uma das mais marcantes. Seja pelos riffs sombrios, letra ocultista que clama pela ajuda divina ou por toda a combinação do recém-inaugurado metal com o jazz, fato é que a faixa consegue causar sensações que se repetem independente de quantas vezes a música seja reproduzida.
Sua existência por si só já é capaz de explicar a importância do álbum, mas quando analisamos todo seu contexto e o que resultou dele, ela se torna ainda mais relevante. Principalmente quando ouvimos grupos que resolveram experimentar com essa combinação sombria e pesada e acabaram descobrindo novos estilos que dariam resultado em subgêneros como o Doom metal e o Stoner.
Essa atmosfera sonora é única em todo o compilado, mas ainda deixa rastros no hard rock psicodélico da clássica “N.I.B”, a única entre as oito faixas a ser tocada pelo grupo em sua despedida. Ela é responsável por uma das levadas de baixo mais icônicas do estilo e pela genial interpretação que Ozzy faz de um conto que assume a perspectiva de lúcifer em um momento de sincera paixão pelo ser humano.
O grupo até poderia ter se aproveitado de sua estética para dizer que a sigla da faixa está conectada com algum significado mórbido ou coisa do tipo, mas isso não seria verdade e autenticidade é um dos marcos do quarteto. Como revelado pelo letrista Geezer Butler para a revista bass player, seu título vem de um momento cômico e que em nada se conecta com a lírica:
“Quando escrevi ‘N.I.B.’, não consegui pensar em um título para a música, então apenas a chamei de Nib, em homenagem à barba de Bill, que parecia uma ponta de caneta, porque era pontiaguda.”
O mesmo não pode ser dito de “Behind the Wall of Sleep”, canção ‘proto-stoner’ que bebe de referências diretas da literatura de terror cósmico de H.P. Lovecraft e que mais uma vez funde o ato de se fazer música com o de contar histórias mórbidas e macabras.
Como álbum, “Black Sabbath” se tornou influente com o passar dos anos e ao mesmo tempo também nutre de diferentes influências criativas. E esse é um fator que aponta para a qualidade atemporal do disco precursor, pois mesmo com todo o lado denso que foi citado aqui, o compilado é essencialmente uma obra originária do blues e do jazz com a soma de riffs graves.
“Sleeping Village”, que pouco precisa de vocais, é uma ode ao experimentalismo com a improvisação do jazz, sobretudo na bateria, enquanto a clássica “The Wizard” une esses elementos de forma coesa com a gaita de Ozzy, as quebras marcantes de Bill Ward, a potência do baixo de Geezer Butler e o calibre pesado de Tony Iommi em letras inspiradas em Gandalf, personagem mágico do Senhor dos Anéis.
Não apenas a literatura foi remanejada no trabalho de estreia da banda, mas outras músicas de seu tempo também. Dentre as oito músicas da versão remasterizada do álbum, duas delas são covers de grupos que nutrem influências similares.
“Evil Woman, Don’t Play Your Games With” é originalmente um blues rock da banda Crow e teve sua animação contagiante cortada pela escuridão do Sabbath, que soube amplificar seu riff principal e sua levada de baixo.
Já “Warning”, do grupo de Aynsley Dunbar, misturava passagens de jazz com o rock psicodélico e teve uma releitura mais pesada e improvisada que triplicou sua duração base de três minutos e alguns segundos para dez minutos e trinta.
Um fato curioso é que as músicas do compilado foram gravadas ao vivo e em apenas 12 horas no estúdio – com exceção dos efeitos de abertura e dobras de guitarra – e colocou a banda para tocar de forma conjunta no momento como se estivesse numa jam.
Isso deu um toque cru/rústico às músicas e não deixou de torná-las marcantes pelo mesmo motivo, principalmente quando falamos de “Wicked World”, que ganhou um cover brutal do Slayer no “Back to the Beginning”.
Além do grupo de Thrash metal dos Estados Unidos, diversos outros artistas de diferentes estilos e subgêneros se uniram em prol da celebração da música do Black Sabbath e mostraram que a importância do legado final da banda ainda continua a passar por seu começo, onde todo um novo estilo foi criado com o pretensioso disco de estreia do quarteto.