Atualizado em: novembro 4, 2025 às 9:09 am

Por: Arthur Coelho

Dizem por aí que as melhores paixões e discos são aquelas descobertas ao acaso, de forma completamente inesperada. E eu posso comprovar isso, pois foi durante uma pesquisa atrás de informações sobre um grupo musical que acabei descobrindo um dos meus vícios mais recentes (e que nada tinha a ver com pesquisa original): a banda visitas póstumas — que, por esse motivo, não poderia ficar de fora da recomendação desta semana.

Composta por Lucas Diesel, Liz athayde, Caetano Stella e Leandro Sodré, o grupo originário de Porto Alegre é envolvido por diversas influências musicais que passam pelo rock alternativo, pelo midwest emo (midwest emo brasileiro é emo que mora em goiânia?)  e por bandas brasileiras de rock sensível (o famoso rock triste).

Por conta dessas referências, o quarteto tem como uma de suas grandes inspirações os pioneiros do American Football, inclusive fazendo um possível trocadilho com o nome da banda no título do EP que marcou a estreia do visitas póstumas no mundo: “Futebol de Salão”, lançado em 2024 de forma independente. Se os estadunidenses reverenciam o futebol americano, nada mais justo que a versão do grupo brasileiro leve o nome de um esporte criado aqui.

Se há inspiração no American Football, significa que aqui também temos as tradicionais guitarrinhas tocadas em cordas inferiores e notas agudas roubando a cena nos compassos. No caso do grupo gaúcho, são justamente elas que abrem o EP, com a introdução de “Deixando Algumas Coisas de Lado”, uma canção poética que vai crescendo a cada instante até um momento de explosão no final, quando os riffs e os pratos da bateria tomam o lugar dos vocais.

E já que estamos nesse assunto, vale uma menção honrosa à ótima faixa “Domingo”, que foi minha porta de entrada para o grupo com uma abertura memorável na dobra de guitarras — mas que, curiosamente, não faz parte do EP.

Voltando ao compilado, temos “Tudo Dando Errado ao Mesmo Tempo”, que mostra outra virtude do quarteto: a elaboração de letras que são emocionais, dramáticas e descontraídas ao mesmo tempo e que recusam estruturas convencionais do rock ou da música pop em geral. Aqui não há refrão, pois o visitas póstumas constrói seu som com uma composição autêntica que não caberia em uma convenção padrão.

E mais, “Tudo Dando Errado ao Mesmo Tempo” é como uma gangorra, que alterna seus sentimentos entre altos e baixos em uma canção de desabafo e que transforma seu otimismo irônico inicial em um lamento de má sorte. Tudo isso de forma surpreendente, porque é justamente quando você acha que a canção chegou ao fim, que ela retorna em seu ápice e apresenta seu clímax poético:

Em constante rotação

No final eu sempre trombo com você

E rasgo o meu pulmão

Cantando músicas que ninguém escutou e nunca vai escutar

A gente vai se encontrar na redenção amanhã

O final feliz de novas vidas

Até o fim de nossas vidas

Eu prometo te amar! 

Eu prometo te odiar!

 

Na terceira música, a faixa que leva o nome do título se inicia com um som mais ligado ao rock alternativo e caminha a partir daí em uma letra que explora a sinceridade emocional de um relacionamento. Mas que, curiosamente, acontece de forma inversa à música anterior: colocando o conformismo otimista como conclusão da faixa (“não importa mais! tá tudo bem“) como resposta ao desespero que aparece anteriormente na música (“E agora quem vai me salvar?/Das forças más que condenam meu coração“).

Tudo isso, para no final o quarteto apresentar um lado diferente de suas identidades, ao menos na escrita. De forma muito criativa, a poesia dá espaço a referências da cultura pop/virtual que trazem outra dinâmica na música de encerramento, que antes mesmo de revelar seus versos, já causa certa nostalgia com o título “Casa Monstro“, que também é o nome de uma animação de muito sucesso no começo dos anos 2000.

Mas não para por aí, a coisa fica ainda mais nichada com citações dos filmes cult do autor Jean-Luc Godard ao lado das plataformas Letterboxd, rateyourmusic e album of the year (faltou o last.fm!) em analogias que fazem a canção contrastar em seus sentimentos.

Essa é uma canção de teor certamente melancólico e de abordagem mais pessimista que as demais, mas que soa de forma descontraída pela espontaneidade do grupo em suas citações que você nunca antes pensou em encontrar nesse tipo de mídia (e que são cômicas para quem sabe o que significa esse bando de termo de site).

Afinal, ninguém entende os filmes do Godard — mesmo os avaliando no Letterboxd com algumas estrelinhas —, mas todo mundo sente a falta de alguém. E só aí já são dois pontos em comum com a banda visitas póstumas, que, de alguma forma, tem esse poder de te causar reconhecimento nos cenários mais inusitados (e tristes) com um som divertido de se ouvir.