Atualizado em: maio 7, 2025 às 10:32 am
Por Arthur Coelho
No último sábado (3), a banda Zander se reuniu na casa de shows Hangar 110, em São Paulo, na sequênciada sua turnê que segue no mêsde maio na cidade do Rio de Janeiro . O setlist, porém, não apenas contou com os principais hits do grupo, como também homenageou os vinte e um anos de um dos discos de maior destaque da cena underground local: “Trilogia Suja de Copacabana” (2004), do Noção de Nada, antigo grupo de seu frontman Gabriel Zander (bateria e vocais) gravado com Eduardo Sodré (guitarra), Gabriel Arbex (guitarra) e Marcelo Malni (baixo e vocal), saindo pelo selo da Manifesto Discos.
E é nesse clima de nostalgia que a recomendação de hoje fica com o terceiro álbum de estúdio lançado pela banda carioca fundada em 1994 e extinta em 2007, mostrando o seu expoente som que viria a ser consagrado em uma cena de bandas que também contava com Dead Fish, Reffer, CPM22 e Sugar Kane: todos unidos pelo hardcore.
Não podendo ser diferente, é de forma rápida, furiosa e intensa que o disco abre com a icônica “Bem Estar II”, já mostrando o salto de qualidade na produção que a compilação mostraria em relação ao seu antecessor, “Trajes e Comportamentos de Acordo Com os Eventos e as Ocasiões” (2001).
“Não sei quantas vezes mais vou ter que fingir/ Não sei por quanto tempo”
A faixa também mostra passadas instrumentais que servem de ponte para o vocal gritado de Gabriel Zander, algo que seria uma marca registrada da banda daqui para frente.
“Mais uma chance eu deixei passar / Me traz mais uma dose, que eu prometo te beijar/ Deixei pra traz o que eu ia dizer/ Perdi… você”
A qualidade permanece no topo com “Mentiras”,” Verdades” e “Conhaque”, mostrando o nível de decepção amorosa que apenas o álcool pode curar, até finalmente chegar ao maior sucesso da banda: a faixa Ímpar.
“E o que restou se não retratos teus/ Meus pés no chão e uma canção de adeus
Já não sei, por tanto tempo procurei/ Não foi por falta de avisar
Esqueça os meus, leve com você os seus/ Medos de nunca se encontrar
Esqueça os meus, leve com você os seus/ Medo de nunca se recordar”
Com um riff que pode ser considerado parte do emocore, a música mostra um lado hardcore sentimental que ficaria ainda mais evidente em seu sucessor (“Sem Gelo”, 2006) e nos futuros trabalhos do vocal Gabriel Zander.
Em seguida, “Feliz” exibe o carioquês do grupo com uma troca nos vocais (Marcelo Malni assume o canto) que acentua o sotaque de seu baixista através de uma letra curta que ressalta as passagens instrumentais da música.
Se o hit Ímpar já mostrava contornos sentimentais, Mais um Fim aprofunda essas características com vocais melódicos que permanecem na ótima faixa “Antes da Enchente”: “Não foi por mal nem sei porque/ Voltar atrás, não sou capaz/ Pra onde ir?/ Pra quem sorrir? / O que me diz de ser feliz?”.
Ela também talvez demonstre o maior tom depressivo de toda a discografia do Noção de Nada, trazendo uma perspectiva de luto e perda.
“Então não vai, não me destrói/ Não vai mais ter uma outra vez/ Não vou chorar/ Então vem dançar/ me leve pra qualquer lugar” (…) “Não há ninguém como você/ E só você me faz sorrir/ Já não consigo nem lembrar do mundo antes de você/ Antes do sol, da chuva, antes de você”
O baixista Marcelo Malni retorna aos vocais com seu excêntrico estilo na curta “Copacabana”, fazendo uma espécie de mistura entre o hardcore e a música de baile.
Voltando ao estilo mais melódico, “Quando Palavras Não Me Machucarem Mais” surge mostrando todo o poder lírico do grupo com as composições de Zander e Malni: “Não moldei seus olhos pra me destruir/ E eu não me esquecerei de agradecer/ Quando palavras não me machucarem mais eu voarei/ Por seus sonhos, por seus olhos”.
Passando daí, o álbum de 27 minutos chega a sua reta final com “Já Já Sossego e a intensa Vitrine”, que mostra um hardcore nu e cru. Até enfim finalizar com a faixa instrumental “Mahali Kita”, que significa ‘Eu te amo em Tagalo’, língua filipina. Hardcore também é multiculturalismo!
Com 11 faixas, o Noção de Nada fez história com um dos discos mais influentes da cena da cena de hardcore underground do Brasil, cantando em português e com letras que dialogam com o cotidiano de toda uma geração, não deixando de perder seu toque poético que o título “Trilogia Suja de Copacabana” exprime tão bem.